GTEP: DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Leisa Sousa
Cumprimentos
Estimular
o debate é de uma certa forma uma posição inquietante.
Como
eu gosto muito do significado das palavras, fui logo encontrar o de DEBATE.
“rolou sentimento” com: “luta em defesa de uma causa”, “exposição de razões em
defesa de uma opinião”, “questão problema”, ferramenta democrática.
E
então encontro em significados e significantes a minha motivação para lutar com
vocês pelo fortalecimento de estruturas essenciais de gestão do SUAS. Para mim
fica a sensação de que o desafio já foi
posto, desde o processo de Construção
do SUAS, mas são provocações que perduram até hoje, até esta fase de busca pela Consolidação.
Falando
em defesa, sinto que precisamos ressignificar
os nossos gritos e bandeiras, na atual conjuntura vivida,
é
preciso sair do lugar da queixa e da lamentação para ocupar lugares de lutas, defesas e trincheiras.
Nós precisamos ser a mudança que
desejamos.
Não
é esperar que falem de Assistência Social, que lembrem de direitos
socioassistenciais...a batalha de dar
mais voz ao SUAS está em nossas mãos, nós que operamos este Sistema, seja
em posição de técnica/o de referência, seja em posição de gestora/r, seja em
posição de controle social.
Neste
importante eixo estratégico, a Gestão do Trabalho, está contido o Trabalho Social e os Trabalhadores. Duas
vertentes imprescindíveis para a Consolidação
do SUAS que tanto perseguimos, e é esta defesa que precisamos fazer.
Eis,
para mim, a primeira inquietação: ? o
quanto está custando para a Assistência Social ter “partido” em um movimento de
implantar serviços e programas (primeiro) e “por segundo” estimular a
implantação da Gestão do Trabalho e da Vigilância Socioassistencial ?
A
primeira inquietação tem âncora no
processo do Trabalho Social que
perpassa pela Trabalhadora/r e ainda
pela qualidade na execução e gestão do
SUAS.
Vejamos:
o Trabalhadora/a é a força motriz do
trabalho social costumamos dizer que é a
principal tecnologia,
é
considerado ainda, a referência para a comunidade,
não
é à toa que nos serviços são chamados de técnicos de referência, ocupam o
sensível lugar de mediar o acesso aos direitos socioassistenciais juntamente
com quem usa o Sistema.
Nessa
lógica, talvez até discurso repetitivo, valorizar
as/os trabalhadoras/es, garantir boas condições de trabalho e investir em
educação permanente são pautas essenciais.
Aqui
eu me deparo com a segunda inquietação: ? de técnica de referência à gestora, pensando
principalmente nas dificuldades em se fazer ou estar gestão, o quanto pode ser
feito para que condições como estas deixem de ser debates para serem conquistas
palpáveis ?
Destaquei
alguns pontos que considero importantes:
a)
Vivemos a dualidade da busca pelo fortalecimento de
vínculos familiares e comunitários
– é uma das essências de nosso trabalho com os usuários,
porém os nossos
vínculos familiares e comunitários, por vezes são fragilizados para ocuparmos o
lugar de trabalhadores do SUAS. Muitos saem dos seus territórios ou terras, às
vezes até são vistos como forasteiros, parece que não se tem hora pra quem
trabalha na AS. São tantas as delicadezas nas jornadas de trabalho e tantas
delas tem enfraquecido a força maior do trabalho
social.
b)
Precarização do trabalho – já cansamos de debater sobre esta pauta,
vivemos reafirmando
compromissos para fazer valer o que está escrito, quando pensamos que vencemos
esta batalha, reformas trabalhistas, terceirização do trabalho aparecem como
carros desgonverdados na contra-mão da construção de um Brasil mais justo e
menos desigual.
E lá vamos nós, não só
defender o SUAS, mas também a nossa melhor condição de oferecer a nossa força
como mecanismo de transformação social.
Nesta dor que vivemos
ultimamente, o coração Sangra e às vezes a desistência vem. Bandeira Branca,
alguns estão levantando. Alguns foram vencidos pela dificuldade.
“Desisti do SUAS”, me
disse uma trabalhadora que sempre foi voz de debate, de força e de luta.
Naquele momento, senti como se tivesse perdido um adolescente para o tráfico,
para o mundo do crime, perdi, perdeu o SUAS aquilo que lhe é mais precioso.
Outros não conseguiram
continuar na labuta porque faltou o recurso para contratá-los. Outros tantos assumem mais de uma função, às
vezes se orgulham em dizer: “eu faço de tudo”... vai anunciando apenas a
primavera, porque o verão é preciso um tanto mais de andorinhas.
c)
Ser agente de transformação, mudando a velha roupa – o que temos hoje, com precarizações de trabalho,
principalmente dos vínculos estabelecidos em contratação, é um prato cheio para
a fome por poder e controle.
“Não vou fazer
concurso, pq vem gente de fora e passa”, dizia o gestor,
seus “servidores/as”
aplaudiram sem saber que por traz dessa justificativa estava o descrédito da
qualidade e sabedoria dos seus munícipes, assim como, aquele executivo
revestido de coronel, falava em mantê-los debaixo de suas asas, liberando BEs
para quem ele encaminhasse, visitas para quem nele votasse, recurso de serviço
sendo componente alquímico para transformar o açúcar do suco do lanche das
atividades em açúcar de cesta básica.
d)
Abrir as “caixinhas”, transcender e integrar a
prática profissional – o trabalho
social no SUAS nos convoca a olhar para as famílias/e seus sujeitos com olhares
multidisciplinares. Daí as tantas perguntas e dúvidas: a quem compete conceder
BEs? Como entender a função privativa de AS e PSI’s? Como podemos contribuir,
com os referenciais teórico-metodológicos da psicologia, serviço social,
direito, pedagogia e outras áreas afins? Como ultrapassar a barreira do
atendimento coletivizado para o particularizado e individualizado?
e)
O Trabalho Social com trabalhadoras/es
especializados – “O SUAS não faz um serviço especializado. Colocaram
os CREAS para atender todo e qualquer público que sofreu violência sexual –
falava o promotor defendendo o modelo do antigo Sentinela como melhor
estratégia que o PAEFI. E ele foi mais longe: “E pior, o que se recebe são
relatoriozinhos quaisquer, porque as equipes não são especializadas” disse em
posição de autoridade, e logo recebeu palmas de um público que verbaliza
descrença nas unidades de assistência social. “Não funcionam”! gritavam.
Como resposta, lá no final da plenária, resistente, meio desconcertada, uma
trabalhadora foi a última a falar: “Se
não fazemos um trabalho especializado, a culpa não é nossa, são muitas as
razões, eu faria uma palestra aqui só para falar delas”.
f)
Metodologia do trabalho social – é preciso colocarmos em prática os referenciais
metodológicos de trabalho na AS. Conceber a tipificação, praticar o registro
seqüenciado de atendimentos, o uso do prontuário, abrir espaços para grupos de
estudos, promover a participação de usuários no plano de atendimento. Precisamos
demonstrar que há eficiência, eficácia e efetividade no trabalho social no
SUAS.
g)
E por último não poderia deixar de falar da Identidade
de Trabalhador do SUAS – escuto muita
gente dizer que está passando uma chuva, que caiu de paraquedas, que está
estudando para um concurso da saúde, que não sabe nada de SUAS, mas “me
chamaram...eu aceitei”. Ou o que não deu certo nas outras secretarias, manda
pra Assistência! É daquele sentimento de pertence que eu estou falando.
Às vezes fico confusa
em pensar porque o encontro de gestores tem tantos trabalhadores/técnicos e os
Fóruns de Trabalhadores são tão esvaziados? É preciso ocupar esses vazios,
formar, fundar, os fóruns municipais de trabalhadores. Realizar grandes
encontros de trabalhadores.
Recentemente
conclamei técnicos e gestores da Bahia para reforçarmos o bom combate na defesa
do SUAS. Depois de fazer parte de duas mesas em que o SUAS foi desrespeitado,
eu não poderia devolver outra resposta, que não um grande eco de: Respeite o SUAS. Doeu não só nos
ouvidos, mas no coração apaixonado por esta Política.
Parece
que já sabemos os caminhos, já identificamos as fragilidades, sabemos o que
precisa melhorar....a sensação que tenho é de que precisamos de fato “ir pra
cima”. As bandeiras do SUAS precisam ser levantadas, nós precisamos gritar, não
mais entre nós, mas nas ruas.
Eu
pensei em concluir falando de trabalho como amor, mas o meu coração bateu forte
foi com a poesia de nosso hino: Verás que um filho teu não foge à luta. Nem
TEME quem te adora a própria morte, terra adorada!
Trabalhadores
Vamos à luta!
Leisa Sousa é psicóloga e exerce hoje a SAS - Superintendência de Assistência Social, na SJDHDS - Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social do Estado da Bahia.