PROTEÇÃO
INSTITUCIONAL GERA PROTEÇÃO FAMILIAR: CONTRIBUIÇÕES DA POLITICA DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL PARA O DESENVOLVIMENTO DA FUNÇÃO PROTETIVA DA FAMÍLIA
A Assistência Social enquanto política publica setorial, de proteção social não contributiva, integrante do tripé da Seguridade Social, por meio do Sistema Único de Assistência Social/LOAS - Lei nº 8.742/1993 revisada com a Lei nº 12.435 de 2011, estabelece como uma das suas diretrizes estruturantes a matricialidade sociofamiliar e o convívio familiar e comunitário, como uma das seguranças a serem afiançadas pelo sistema.
Embora historicamente reconhecida
pelo campo das ofertas materiais – benefícios socioassistenciais, a Assistência
Social tem um vasto campo de entregas imateriais, sendo uma política
caracterizada por alguns teóricos como uma política do campo relacional, haja
vista o conjunto expressivo dos seus serviços socioassistenciais, sejam eles de
proteção social básica ou proteção social especial.
A potencialização da função protetiva
da família – reprodução material e cuidado afetivo/relacional, é objeto dos serviços socioassistenciais, por
reconhecermos que questões estruturais e sociais, que permeiam uma sociedade
desigual, marcada por concentração de riquezas socialmente produzidas, por vezes
inviabilizam a maioria das famílias brasileiras no exercício desta função.
Podemos afirmar que as situações de risco às quais estão submetidas tais
famílias, somadas ao precário e nulo acesso a direitos/políticas publicas, as
tornam mais vulneráveis socialmente, portanto com menor capacidade ou condições
de reagir e enfrentar os riscos sociais.
Por família compreende-se grupo de pessoas unidas por laços consanguíneos, afetivos ou
de solidariedade. “A
família, independentemente dos formatos ou modelos que assume, é mediadora das
relações entre os sujeitos e a coletividade, delimitando, continuamente os
deslocamentos entre o público e o privado, bem como geradora de modalidades
comunitárias de vida. Todavia, não se pode desconsiderar que ela se caracteriza
como um espaço contraditório, cuja dinâmica cotidiana de convivência é marcada
por conflitos e geralmente, também, por desigualdades, além de que nas
sociedades capitalistas a família é fundamental no âmbito da proteção
social”(PNAS 2004).
A segurança de convívio familiar e comunitário,
possibilita, por meio da oferta pública de serviços socioassitenciais continuados,
um trabalho socioeducativo, envolvendo o acompanhamento psicossocial proativo e
preventivo, que garantam a construção, restauração e o fortalecimento de laços
de pertencimento e vínculos sociais, de natureza geracional, Intergeracional,
familiar, de vizinhança e societário. Assim, a configuramos como um direito
socioassitencial, a luz da compreensão de que todo individuo é um ser sociável
e que, portanto, sua condição de existência perpassa essa dimensão das relações
sociais/familiares.
Obviamente que família não é um tema
privativo da Assistência Social, inclusive por conta de que este tema se
concretiza e se avoluma no rol das políticas sociais, desde os anos 40, na Política
de Assistência Social e na Saúde, embora através e uma lógica de filantropia e
médica. O que se pode constatar até aqui é que a Assistência Social efetivou um
caminho de construção e demarcação do tema ”família” como um fim e não como
meio.
Ao longo da sua trajetória de
construção e consolidação, a Política de Assistência Social, combinou os temas
“família” e “pobreza”. Nos seus primórdios, permeava uma lógica
assistencialista, focalista, subalternizante, residual, sendo instrumento de
reprodução das desigualdades e dominação. Já a partir dos anos noventa, com a
cultura dos direitos sociais inaugurada com a Constituição de 88, e o
reconhecimento dos pobres como sujeitos sociais, num contexto de aquecimento
dos movimentos sociais, tivemos o desenvolvimento do trabalho com família na
perspectiva de proteção e cidadania.
No campo dos serviços, de proteção
social básica ou de proteção social especial de media e alta complexidade,
desenvolvemos o chamado “trabalho social com famílias” que consiste em
“Conjunto de procedimentos efetuados a partir de pressupostos éticos,
conhecimento teórico-metodológico e técnico-operativo, com a finalidade de
contribuir para a convivência, reconhecimento de direitos e possibilidades de
intervenção na vida social de um conjunto de pessoas, unidas por laços
consanguíneos, afetivos e/ou de solidariedade – que se constitui em um espaço
privilegiado e insubstituível de proteção e socialização primárias, com o
objetivo de proteger seus direitos, apoiá-las no desempenho da sua função de
proteção e socialização de seus membros, bem como assegurar o convívio familiar
e comunitário, a partir do reconhecimento do papel do Estado na proteção às
famílias e aos seus membros mais vulneráveis. Tal objetivo materializa-se a
partir do desenvolvimento de ações de caráter “preventivo, protetivo e
proativo”, reconhecendo as famílias e seus membros como sujeitos de direitos e
tendo por foco as potencialidades e vulnerabilidades presentes no seu
território de vivência.” (BRASIL, 2012b:11).
Especificamente no campo da proteção
social especial de alta complexidade, no caso de crianças e adolescentes,
lidamos com a perda do poder familiar, que torna o trabalho com família mais
desafiador, incluindo a articulação entre as equipes de media e alta
complexidade na perspectiva da reinserção familiar. A destituição do poder
familiar é uma medida protetiva que visa resguardar as crianças e os
adolescentes de situações que afetem a sua integridade física e psicológica, sendo
uma medida extrema/excepcional que só acontece em último caso. Exige dos
profissionais análise de todos os fatos, dinâmica e contexto sócio-familiar de
forma cautelosa, considerando inclusive os aspectos sócio-econômicos e
políticos, as situações de vulnerabilidade e risco social, e, portanto, as
expressões da questão social e a ausência de políticas públicas no território.
É essencial entender que a questão social não se reduz apenas ao valor da renda
dos indivíduos, ela se refere a múltiplos fatores como privação dos direitos,
de atendimento, de salários, de trabalho e de moradia. Privações essas que
afetam diretamente as crianças e os adolescentes (SANTOS, 2012).
Vulnerabilidade social, de acordo com
as definições e observações de Aldaisa Sposatti, diz respeito à densidade e à
intensidade de condições que portam pessoas e famílias para reagir e enfrentar
um risco, reconhecendo capacidades ou a capacidade de resistência a confrontos
e conflitos. Já o significado de risco social supõe conhecer as incidências, as
causalidades, as dimensões dos danos para estimular a possibilidade de
reparação e superação, o grau de agressão do risco.
“Por reconhecer as fortes pressões
que os processos de exclusão sociocultural geram sobre as famílias brasileiras,
acentuando suas fragilidades e contradições, faz-se primordial sua centralidade
no âmbito das ações da política de assistência social, como espaço privilegiado
e insubstituível de proteção e socialização primárias, provedora de cuidados
aos seus membros, mas que precisa também ser cuidada e protegida” (PNAS 2004).
Para fazer frente às situações de
vulnerabilidade e risco social, associadas a violação de direitos, violência,
e/ou ruptura ou fragilidade de vínculos familiares, na direção da
desnaturalização das manifestações da questão social, de descortinar e
visibilizar contradições históricas de um sistema capitalista excludentes, e na
concepção de que a capacidade protetiva da família se desenvolve ou se
potencializa a depender do quanto de proteção institucional elas acessam via
políticas publicas, construímos e
praticamos o trabalho social com famílias fazendo uso de instrumentos de
registros e técnico-operacionais - plano
de acompanhamento familiar, plano de atendimento individual, prontuário SUAS,
registro mensal de atendimento – RMA, relatório de acompanhamento físico – RAF,
entrevista, visita domiciliar, encaminhamentos, reuniões, relatório de
acompanhamento familiar. Há que se considerar que tal trabalho envolve fases como:
reconhecimento, avaliação da situação, acompanhamento familiar/implementação do
Plano de Acompanhamento Familiar, avaliação/ desligamento/fechamento.
Mas para dar sentido político e ético ao uso
destes instrumentos, é indispensável conhecer, compreender e analisar: quem são as famílias (envolve o conhecimento
de diferentes aspectos tais como, a localização do domicílio, a sua composição,
a idade dos membros da família, a escolaridade e os motivos pelos quais
recorrem aos serviços); como vivem as
famílias (relaciona-se ao conhecimento de como se organiza a vida familiar, as
condições de vida e como se estabelece a
convivência familiar e comunitária, e inclui também informações sobre profissão e ocupação dos seus membros, o
acesso à renda, sobre o território onde
vivem e como se realiza o acesso aos serviços de infraestrutura, aos serviços
sociais e aos bens culturais do território e da cidade) e como exercem proteção
social (à família cabe a tarefa de articular a proteção dos seus, através das
negociações que estabelece entre seus membros e com outras esferas da
sociedade, perpassando questões de conjugalidade, parentalidade,
intergeracionais, as relações de
autoridade e poder, as relações de cuidado com os dependentes - crianças, adolescentes, idosos, doentes,
deficientes).
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
•GUERRA, Yolanda. A
Instrumentalidade do Serviço Social. São Paulo, Cortez, 1995.
•Concepção e gestão da
proteção social não contributiva no Brasil. -- Brasília: Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, UNESCO, 2009.
•Fundamentos ético-políticos e rumos teórico
metodológicos para fortalecer o Trabalho Social com Famílias na Política
Nacional de Assistência Social, MDS,
Brasília – 2016
•Caminhos para a
cidadania: a experiência do Centro de Referência Especializado de Assistência
Social, CREAS, do Município de Rio Claro, SP, na garantia dos direitos humanos
/ (organização Gabriela Schreiner). Rio Claro, SP:
Prefeitura Municipal de Rio Claro, 2013.
•Documento técnico
orientador para subsidiar o seminário nacional sobre trabalho social com
famílias na PNAS à luz das avaliações sobre a produção acadêmica na área da
Assistência Social e a produção institucional do MDS sobre trabalho social com
famílias realizadas nos produtos anteriores. https://aplicacoes.mds.gov.br/sagirmps/ferramentas/docs/Produto%203%20-%20TSF_MIOTO.pdf
Consultora: Regina Célia Tamaso Mioto -Setembro de 2015
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